Vivemos a era dos 'faces', mas não dos 'books', escreve leitor

Vivemos a era dos 'faces', mas não dos 'books', escreve leitor

21/02/2013 - 16h25

LEITOR GUSTAVO GUMIERO
DE VALINHOS (SP)

Há um antigo ditado dizendo que a música é a linguagem universal. Mais que isso, a música é a linguagem de determinado povo, de determinada sociedade.

Se percorrermos brevemente a história recente do Brasil, podemos constatar a brilhante obra de Carlos Gomes intitulada "O Guarani". Emociona só de ouvir a sua introdução no programa "A Voz do Brasil".

Depois tivemos muitos e excelentes compositores românticos, como Lupicínio Rodrigues, Pixinguinha e tantos outros, que explicitavam a romântica sociedade.

Na fase da ditadura, havia o excelente Chico Buarque protestando e sendo exilado pelo governo. Existiu também o movimento da Jovem Guarda.

Já no final dos anos 70 e início dos anos 80 não posso deixar de citar as vozes que gritavam. Renato Russo e Raul Seixas, esse último com sua formação humilde, mas erudita. Ficava trancado em seu quarto lendo livros e saía a ver os filmes do Elvis Presley. Ganhou, por isso, um par de óculos, dos quais nunca se livrou na vida.

Renato dos Anjos - 8.mar.84/Folhapress
O roqueiro Raul Seixas no Festival de Águas Claras, em Iacanga, no interior de São Paulo
O roqueiro Raul Seixas no Festival de Águas Claras, em Iacanga, no interior de São Paulo

Isto tudo sem citar as excelentes duplas verdadeiramente sertanejas que cantavam o amor ao campo, à natureza, em um tempo que o Brasil ainda era rural.

Gostaria de parar por aqui, mas preciso falar daquilo que toca no rádio atualmente --e que me recuso a chamar de música. Lembro-me de uma personagem do programa de TV, a Escolinha do Professor Raimundo, que dizia, com todo o pudor, que o professor só pensava "naquilo".

Hoje, o "naquilo" de antigamente ganhou muitos sinônimos. Basta ligar o rádio e rapidamente se ouvirá os tchus, os tchás, os berês, os barás, os parapás.

São reflexos de uma sociedade que não consegue falar de amor e nem expressá-lo. São reflexos de uma sociedade que perdeu o pudor e que "as coisas que tocam no rádio" estão na boca das crianças e na mente dos adultos. Transformam-se em mantras que são cantados e não saem da cabeça; nos ocupam e ocupam nosso tempo.

Assim, quando sairmos do trabalho é melhor deixar o rádio desligado. A "música" atual é a encarnação da sociedade que não quer pensar em nada, que não consegue ler um texto e interpretá-lo.

A música atual é produzida como um objeto qualquer: há um processo mecanizado, pelo qual decidem-se a introdução, o tempo, a batida, as frases, os refrões. É tudo automático.

Vivemos a era dos "faces", mas não dos "books"! Morreu-se a ideologia e a utopia não existe mais.

Pai, afasta de nós esse cálice.




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