Godard defende um condenado por pirataria na internet

É a velha 'democracia' francesa em ação... 
'Liberté, Egalité, Fraternité! Oui!'
De revolucionário, só o Godard mesmo.

Um francês condenado por roubo de direitos autorais ao baixar milhares de músicas na internet encontrou um padrinho improvável: Jean-Luc Godard, o famoso diretor de cinema de 79 anos, que fez filmes como Acossado e Alphaville. Ele defende James Climent, um fotógrafo que enfrenta uma multa de 20 mil euros por violar direitos autorais musicais.

Climent, que mora em Barjac, uma pitoresca cidade antiga de artistas e fazendeiros de produtos orgânicos na região do Gard, no sul da França, quer levar seu caso ao Tribunal Europeu de Direitos Humanos, em Estrasburgo. A mais alta corte francesa rejeitou sua última apelação, em junho, ficando ao lado das agências que recolhem royalties musicais e que denunciaram Climent cinco anos atrás.

O fotógrafo disse que Godard doou 1 mil euros esse mês para seu fundo, dos 5 mil euros necessários para pagar advogados e outros custos necessários para levar seu caso ao tribunal europeu.

Enquanto as opiniões de Godard sobre propriedade intelectual são amplamente compartilhadas na periferia libertária da internet, pode parecer surpreendente que venham de um diretor que, segundo a lei francesa, detém o controle editorial sobre seu trabalho e obtém vantagem financeira disso.

No entanto, Godard, um dos pioneiros da Nouvelle Vague francesa na década de 1960, cujos filmes alfinetam as convenções da sociedade burguesa, claramente ainda se deleita em provocar o establishment, mesmo que isso possa lhe custar dinheiro.

Leis - O apoio de Godard a Climent mostra como o debate sobre compartilhamento de arquivos é cada vez mais politicamente carregado na França. Climent foi condenado em virtude da legislação de direitos autorais há muito tempo. Mas agora as autoridades estão prontas para começar a executar uma lei nova e dura, nas quais as conexões de piratas contumazes podem ser suspensas.

"O download é um direito do cidadão", disse Climent. "Mesmo se houver uma pequena chance, há uma possibilidade de que uma decisão favorável possa mudar as leis em toda a Europa."

Godard ainda não fez comentários públicos sobre o caso de Climent, mas expôs as razões para sua oposição às regras de direitos autorais francesas em uma entrevista recente à revista cultural Les Inrockptibles, na qual declarou: "Não há nada como a propriedade intelectual".

"O copyright realmente não é viável", disse Godard. "Um autor não tem direitos. Eu não tenho direitos. Tenho só deveres."

Godard não foi encontrado, mas um sócio, que insistiu em se manter anônimo porque não tinha autorização do diretor para falar, confirmou a doação. Godard, disse o sócio, queria fazer um "gesto simbólico" para chamar a atenção sobre a situação de Climent.

Além do dinheiro, Climent disse que recebeu um bilhete manuscrito e a foto de um modelo de veleiro e a despedida, "Surcouf, Jean-Luc Godard"– referindo-se a Robert Surcouf, um pirata dos tempos da Revolução Francesa.

França - O apoio de Godard a Climent reflete algumas reviravoltas incomuns no debate sobre pirataria na França, onde as vendas de conteúdo digital por serviços autorizados tem sido mais lentas do que nos Estados Unidos. O governo conservador do presidente Nicolas Sarkozy tem defendido medidas duras para reforçar a aplicação da propriedade intelectual. Seus esforços encontram resistência feroz da oposição socialista, o que representa um paradoxo, já que tradicionalmente é o partido com laços mais estreitos com a área cultural.

A peça central da repressão de Sarkozy sobre a pirataria é a chamada lei de resposta gradual, em que as pessoas que compartilham músicas digitais, filmes ou outros conteúdos de mídia podem ter sua conexão com a internet suspensa se ignorarem repetidos avisos para interromper a prática.

Os primeiros avisos por e-mail serão enviados a pessoas acusadas de pirataria dentro de poucos dias, de acordo com a agência governamental criada para administrar a lei.

Pode levar muitos meses, no entanto, até que o governo resolva desconectar pessoas da internet. É possível passar mais de um ano antes que o acusado de compartilhar arquivos receba a última advertência, informando que poderá ser levado a um tribunal.

Para ter a chance de uma audiência na corte de Estrasburgo, Climent pode ter de esperar até o final do ano. Casos em altas cortes europeias podem se arrastar por anos.

Nicolas Gallon, o advogado de Climent, reconheceu que as chances de vitória são pequenas, dada a série de julgamentos contra ele na França. "Com toda a honestidade, será muito difícil", disse Gallon, que já representou outras figuras da contracultura francesa, como o militante anti-globalização José Bové. "Não estamos muito otimistas. Mas temos de levar esse debate tão longe quanto pudermos."

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